quinta-feira, 3 de julho de 2008

Homem e Mulher


Sou fã do Contardo Calligaris (aliás, como a maior parte das pessoas que conheço), e acompanho a coluna dele na Folha de São Paulo. Hoje, ele tratou de um tema que é sempre interessante: a identidade de gênero.

O que é que nos torna o que somos - homem ou mulher?

Contardo elenca algumas possibilidades: a cultura, a biologia, ou, ainda, a escolha. E menciona como exemplo desta última algo que ocorria nas montanhas do norte da Albânia. Uma cultura com divisão rígida entre homens e mulheres, em que vige um sistema de mortes perenemente compensadas (mate um dos meus, eu mato um dos seus), mas apenas entre homens. Assim, em muitas famílias, restavam apenas mulheres. E aí é que entra a escolha: uma mulher virgem poderia escolher ser homem, e passar a agir e ser vista como tal pelo resto da vida.

Algo assim nos apresenta uma idéia que não é nova, mas que é sempre intrigante. A de que somos o que somos porque escolhemos, a cada instante, sê-lo. E que isso inclui até mesmo a nossa opção sexual.

Essa escolha não se processa de forma racional. Não consigo imaginar alguém parado na frente do espelho, dizendo para si mesmo "hoje quero continuar a ser homem". Mas poucas escolhas são realmente racionais, e o controle que temos sobre o que escolhemos é assustadoramente limitado.

Na maior parte do tempo, simplesmente escolhemos, e, se alguém nos pergunta a razão, não sabemos dizer. Carne ou peixe? Preto ou vermelho? Beatles ou Rolling Stones? Atlético ou Cruzeiro? Alguma razão em especial para a escolha? Possivelmente não.

Ser mulher é trabalhoso, porque mulher não tem signo, nem símbolo, porque é coisa inventada. Homem é o falo, as grandes torres, os carros velozes, os símbolos de status. E mulher? Mulher é o quê? Bolsa e sapato, como em Sex and the City?

Já disse: mulher é inventada. É coisa que não existe. Mistura de força e de fragilidade, de coragem e de delicadeza, e não se explica. E sofre por não se explicar, por não se permitir compreender: nem Freud, nem Lacan, conseguiram, por mais que tentassem. Talvez porque sejam homens. Se fossem mulheres, nem tentariam, porque já saberiam, de nascença, que mulher não se explica.

É preciso escolher a cada dia, e não é difícil entender por que alguém escolheria deixar de ser mulher, para poder ser homem, em paz. O falo (não o físico, mas aquele outro, também inventado, que é puro símbolo) facilita tudo.

2 comentários:

Juliana Dacoregio disse...

Contardo é uma febre agora né... Também escrevi um post sobre ele e já li mais uns 5 blogs falando sobre Calligaris.

Anônimo disse...

Explicar o que não deve ser explicado. Entender o que não deve ser entendido. Uma mulher não deve ter todos seus mistérios e segredos revelados, não se vasculha todos os seus porquês, apenas estar ao lado delas e amá-las.

Na convivência não se muda alguém já que eu acredito que cada tem sua essência, essência essa que é bruta, imutável e inegociável. Ceder sim, mudar não.

Gostei do seu artigo.

Léo Dias

PS - Tive dificuldades em enviar o comentário pelo OpenID. Espero não ter recebido mais de um.